Leonardo Boff

A atual crise político-social demanda profetas (1ª parte)

O profetismo é um fenômeno não somente bíblico. É atestado em outras religiões como no Egito, na Mesopotâmia, em Mari e em Canaã, em todos os tempos, também nos nossos. Há vários tipos de profetas (comunidades proféticas, visionários, profetas do culto, da corte etc) que não cabe aqui analisar.

Clássicos são os profetas do Primeiro Testamento (dizia-se antes Antigo Testamento) que se mostravam sensíveis às questões sociais como Oséias, Amós, Miquéias, Jeremias e Isaías.

Na verdade, em todas as fases do cristianismo esteve sempre presente o espírito profético, como entre nós inegavelmente com Dom Helder Câmara, com o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, com Dom Pedro Casadáliga e outros, para ficar somente no Brasil.

O profeta é um indignado. Sua luta é pelo direito e pela justiça especialmente dos pobres, dos fracos e das viúvas, contra os exploradores dos camponeses, contra os que falsificam pesos e medidas e contra o luxo dos palácios reais. Eles sentem um chamado dentro de si, interpretado no código bíblico, como uma missão divina.

Amós que era um simples vaqueiro, Miquéias um pequeno colono e Oséias, casado com uma prostituta, largam seus afazeres e foram ao pátio do templo ou diante do palácio real para fazer suas denúncias. Mas não apenas denunciam. Anunciam catástrofes e após anunciam uma nova esperança de um recomeço melhor.

São atentos aos acontecimentos históricos também em nível internacional. Por exemplo, Miquéias increpa Nínive, capital do império assírio: “Ai da cidade sanguinária, tudo nela é mentira. De roubo está cheia e não para de saquear. Lançarei sobre ti imundícies” (3,1.6). Jeremias chama Babilônia de “a metrópole do terror”.

Devemos entender corretamente as previsões dos profetas. Não é que anteveem as catástrofes, como se tivessem acesso a um saber especial. O sentido é esse: a persistir a atual situação e a se negar a mudá-la, de exploração, de práticas contra os indefesos e de abandono da reverente relação com Javé, terá como consequência uma desgraça.

Logicamente desagradam aos poderosos, aos reis e até ao povo. São chamados de “perturbadores da ordem”, “conspiradores contra a corte ou o rei”. Por isso os profetas são perseguidos, como Jeremias que foi torturado e posto na prisão; outros foram assassinados. Poucos profetas morreram de velhos. Mas ninguém lhes fez calar a boca.

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