Aquicultura e Pesca

História ou estória de pescador?

Qual a diferença de se utilizar as palavras história e estória? De acordo com o sistema gráfico brasileiro de 1943, nenhuma. Ambas são utilizadas para definir prosas ou contos, sendo estes reais ou fictícios. O uso destas palavras sem distinção entre as mesmas, persiste até hoje, mesmo sendo discutível entre alguns estudiosos da nossa língua portuguesa. Entretanto, antes de 1943, o termo estória era usado para relatar fatos fictícios, enquanto história para relatos ou fatos que ocorreram, ou seja, verdadeiros.
Talvez, se estas palavras fossem usadas com distinção até hoje, ambas seriam empregadas comumente em relatos de pescadores sobre seus feitos e pescarias. Alguns pescadores, quando contam seus “causos”, aumentam um pouquinho: usaríamos história. Outros inventam e criam fatos saídos de uma epopeia grega: usaríamos estória.
Mas qual o motivo deste papo de gramática em nossa coluna semanal? O principal motivo é que o relato fidedigno do pescador sobre sua atividade é uma ferramenta de grande valia para as ciências pesqueiras. Em conjunto com projetos e outros métodos de pesquisa, tais como coleta de dados experimentais, o conhecimento e percepção do pescador sobre o mar, os peixes e sobre as condições da área onde atua veem sendo cada vez mais utilizados por cientistas no mundo todo, em busca de melhorias ambientais e no setor produtivo da pesca.
Usando destes métodos acima citados, os pesquisadores buscam estimar, por exemplo, quantos peixes de determinada espécie existem em uma área e como esta população pode ser explorada economicamente sem inviabilizar seu ciclo de vida. Estas estimativas são muitos úteis, pois o trabalhador que atua no mar nunca poderá contar com exatidão o número de peixes que existe. Isto diverge da realidade de outras atividades, tais como a pecuária, onde se tem uma contagem exata do rebanho e dificilmente se exploraria seus lotes até a exaustão do recurso para momentos futuros.
Deste modo, a aproximação entre pescadores e cientistas é benéfica para ambos os lados. O pescador que realmente depende da natureza e de seus recursos se beneficia da manutenção ambiental. Em muitos casos, o pescador desempenha um papel de vigilante sobre estes recursos. E os pesquisadores obtêm informações verdadeiras, de modo a gerar conhecimento cientifico robusto para a conservação ambiental e para subsidiar a geração de políticas públicas (leis) que visem manter um dos maiores bens do povo brasileiro: seus recursos naturais.
Vamos dar um exemplo do que a falta de aproximação entre pescadores (setor produtivo) e cientistas poderia gerar. Imagine que exista uma lista de espécies ameaçadas em um pais e que esta lista proíba a captura de algumas espécies, pois estas estão consideradas como em processo de extinção. Imagine agora que exista um programa de monitoramento destas espécies, realizada por pesquisadores. O objetivo deste monitoramento seria obter informações sobre estas espécies e de como elas interagem com a atividade pesqueira. Agora imagine que você é um pescador e que estes pesquisadores fossem te entrevistar. O que você faria? Omitiria ou aumentaria informações (estória no passado)? Ou contaria de forma correta o que vem presenciado em sua atividade (história no passado)? Pense agora que suas informações, enviesadas ou não, seriam utilizadas, junto com outros métodos de pesquisa, para se gerar conhecimento cientifico. E, que estes conhecimentos, seriam consultados para se gerar políticas públicas na sua área de atuação.
Ao fazer o exercício mental acima, lembre-se que as leis criadas se utilizando das informações repassadas poderiam proibir ou liberar a pesca de algum recurso importante para a atividade. Quanto mais informação verdadeira se tiver das pescarias, melhor a compreensão de seus limites e mais assertivas as escolhas a serem tomadas. Tenha também em mente que os peixes são organismos vivos, que dependem de um numero mínimo de indivíduos para se gerar novos descendentes e, por fim, lembre-se de que não existe pesca e pescador sem peixe no mar…

Por:
Prof. Dr. Eduardo Guilherme Gentil de Farias, Engenheiro de Pesca
Prof. Dr. Giovanni Lemos de Mello, Engenheiro de Aquicultura
Prof. Dr. Jorge Luiz Rodrigues Filho, Biólogo
Prof. Dr. Maurício Gustavo Coelho Emerenciano, Zootecnista
aquicultura.pesca@gmail.com

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