Leonardo Boff

O pior do golpe: Impossibilitar o estado social brasileiro (1ª parte)

Os fatos recentes: a proibição do Prêmio Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel (1980) e de outros notáveis da política, de visitar o ex-Presidente Lula, um prisioneiro político e amigo de todos os que queriam vê-lo, é a prova mais cabal de que vivemos sob um regime de exceção jurídico-mediático. As togas comandaram. A juíza Catarina Lebbos, braço direito do juiz Sérgio Moro, revela traços de crueldade e desumanidade ao proibir um médico de examinar o estado de saúde do ex-presidente. Não estou seguro mas desconfio de que tal ato seja até criminoso, passível de punição.
A gravidade maior de nossa crise é a estratégia dos endinheirados (0.05% da população), associados como sempre a conglomerados econômico-financeiras e até estrangeiros, inclusive com a nossa mídia monopolista conservadora, de quebrar o pacto social construído sob a hegemonia das forças democráticas, progressistas e de esquerda, consignado pela Constituição de 1988.
Pelo consenso que ela propiciou entre os vários grupos, até antagônicos, se gestaram as bases para a criação de um Estado Social brasileiro. Seria um primeiro passo para atacarmos nossa chaga maior que é a perversa desigualdade social e a inclusão de milhões de brasileiros e brasileiras na cidadania.
A condução era feita por alguém que as elites do atraso jamais aceitaram mas que tiveram que se vergar ao veredito das urnas, um operário, vindo da pobreza nordestina, Luiz Inácio Lula da Silva. Por suas políticas sociais fizera com que os do andar de baixo pudessem subir um degrau na escada social.
Quando se deram conta de que poderia surgir uma nova hegemonia de caráter progressista e popular, estas classes, como sempre antes na história, segundo nossos melhores historiadores como José Honório Rodrigues, tramaram um golpe de classe. Tratava-se de assegurar a natureza de sua acumulação e de seu poder sobre o Estado.
Mudaram os tempos, mudaram também as estratégias. Devia ser não por um golpe não militar, mas parlamentar. Marcelo Odebrecht, presidente de uma das maiores empresas brasileiras, em sua delação premiada, confessou que repassara dez milhões de reais para comprar 140 deputados a fim de que garantissem o impeachment de Dilma Rousseff.
Um congresso, dos mais medíocres da história republicana, com ladrões uns, acusados de corrupção outros ou denunciados por crimes, até por assassinato, deixou-se penalmente comprar. Deram um golpe parlamentar, jurídico e mediático depondo por um impeachment questionável a Presidenta legitimamente eleita Dilma Rousseff. O objetivo não era fundamentalmente ela, mas atingir o ex-Presidente Lula e o partido do PT.
O combate à corrupção, doença endêmica da política brasileira, nem por isso desculpável, serviu de pretexto para atacar, processor e literalmente perseguir a Lula, mediante o expediente da lawfare (interpretar canhestramente a lei para prejudicar o acusado). Tanto fizeram que conseguiram colocá-lo na prisão, mediante um processo, segundo os mais renomados juristas nacionais e estrangeiros, viciado e vazio de provas materiais consistentes.

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