Há 17 focos de guerra no mundo, o mais visível de todos na Ucrânia atacada pela Rússia com alto poder de destruição. Gravíssima foi a decisão dos países ocidentais, englobados pela Nato que tem os USA como seu principal ator, ao estabelecer “um novo compromisso estratégico” de passar de um pacto defensivo para um pacto ofensivo. Declara ipsis litteris a Rússia como inimigo presente, e mais adiante a China. Não se trata de um concorrente ou adversário, mas de inimigo que na perspectiva do jurista de Hitler Carl Schmitt, cabe com-bater e destruir, usando todos os meios inclusive os militares e, no limite, os nucleares. Como apontou o reconhecido economista ecológico Jeffrey Sachs, reforçado por Noam Chomsky: se isso ocorrer seria o fim da espécie. Isto significaria a grande tragédia.
Talvez a ameaça mais eminente nos vem do já citado aquecimento global acelerado. Com o esforço conjugado de todo os países dever-se-ia limitar o aquecimento a 1,5 grau Celsius até 2030. Agora constata-se que se acelerou com a entrada maciça do metano devido ao degelo das calotas polares e do parmafrost. Antecipou-se para 2027. O último relatório em tres vo-lumes do IPCC publicado há poucos meses advertiu que poderá vir bem antes. Há o risco notado já anteriormente pela Academia Norte-americana de Ciências de um “salto abrupto” que pode elevar o clima a 2,7 ou mais graus Celsius. A conclusão que o IPCC chega é “que os impactos em todo mundo constituem uma ameaça à humanidade”. Grande parte dos or-ganismos vivos não consegue se adaptar e acaba desaparecendo. Da mesma forma multidões humanas podem sofrer terrivelmente e também morrer antes do tempo. Tal evento po-de ocorrer nos próximos 3-4 anos. Não parece que os analistas e os planejadores tomam em conta essa eventualidade.
Daí se entendem que alguns cientistas em clima, sejam tecnofatalistas e céticos. Afirmam que com as bilhões de toneladas de CO2 e de outros gases de efeito estufa já acumulados na atmosfera (eles permanecem cerca de 100 anos) não temos condições de impedir o aquecimento global. Chegamos tarde demais. Os eventos extremos fatalmente virão, cada vez mais frequentes e danosos, devastando partes dos biomas terrestres e das costas marítimas. Pelo fato de dispormos de ciência e de tecnologia podemos apenas mitigar os efeitos nocivos mas não de evitá-los. Eis uma crise de nosso tipo de civilização.
Acresce a este quadro dramático, a Sobrecarga da Terra: consumimos mais do que ela nos pode oferecer, pois necessitamos mais de uma Terra e meia (1,7) par atender as demandas do consumo humano, especialmente, aquele suntuoso das classes opulentas.
Diante deste cenário inegavelmente dramático que pensar? Talvez tenha chegado a nossa vez de sermos excluídos da face da Terra? Dada a voracidade do processo produtivista mundializado que não conhece moderação, a cada ano estão desaparecendo cerca de 100 mil espécies de organismos vivos. Aqui cabem as palavras do eminente naturalista francês Théodore Monod, por nós algumas vezes citado:” somos capazes de uma conduta insensata e demente; pode-se a partir de agora temer tudo, tudo mesmo, inclusive a aniquilação da raça humana: seria o justo preço de nossas loucuras e de nossas crueldade”. Essa opinião é compartilhada por outras notáveis personalidades como Toynbee, Lovelock, Rees, Jacquard, Chomsky entre outros.
Não podemos travejar como será nosso futuro. Mas ele não pode ser o prolongamento do presente. A natureza da lógica capitalista não mudará senão a obrigaria a renunciar de ser o que é e quer: acumular ilimitadamente sem cuidar das externalidades.
Como mostrou Hans Jonas em seu livro O Princípio Responsabilidade, o fator medo e pavor pode ser decisivo. Ao dar-se conta de que pode desaparecer, o ser humano fará tudo para sobreviver, como os navios antigos que sob risco de naufragar, jogavam toda a carga ao mar. Haveria mudanças radicais especialmente no consumo frugal e solidário.
Existe ainda o princípio do imponderável e do inesperado da mecânica quântica. A evolu-ção não é linear. Em momentos de alta complexidade e de grande caos pode dar um salto para uma nova ordem e conquistar um outro equilíbrio. No nosso caso não é impossível. Mas seguramente se fará com o sacrifício de vidas também humanas. É o nosso drama.
Por fim, há a esperança teologal, o legado judaico-cristão, que deve ser entendido também como uma emergência do processo evolucionário e não como algo exógeno. Ela afirma o princípio da vida e do Deus vivo e doador da vida que criou tudo por amor. Ele poderá criar condições para os seres humanos se converterem para um outro rumo de seu destino e assim poderem se salvar. Mas “chi lo sa”? A nós cabe o esperançar de Paulo Freire, quer dizer, criar as condições para a utopia viável, a esperança, de que o inesperado acontecerá e que a vida sempre terá futuro e está destinada a mudar para continuar e continuar brilhando.
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