Há alguns anos, já no final da faculdade, participei de uma seleção de estágio para um grande escritório de advocacia. O detalhe? Quando soube da vaga e decidi me candidatar, foi deixado bem claro que um homem seria contratado e que mulheres nem deveriam perder seu tempo encaminhando o currículo. Eu ignorei essa advertência e, poucos dias depois da entrevista, fui chamada para a vaga, a qual recusei por outros motivos. Ah! Antes que alguém possa sequer pensar que um vestidinho preto e justinho garantiu a minha entrada, deixe-me ressaltar que, nessa época, meu guarda roupas era basicamente constituído de calças jeans e tênis All Star, uma verdadeira lástima para qualquer estudante de Direito. A verdade é que eu nunca questionei se a minha vida seria mais fácil ou difícil por ser mulher. Nunca pensei que poderia ganhar menos, ser preterida em uma promoção ou até mesmo ter minha capacidade questionada, pelo simples fato de ter nascido com um determinado sexo. Eu nunca me achei melhor ou pior por ser menina, nem mais ou menos valorizada. Isso também não determinou o que eu deveria aprender ou do que eu deveria gostar, ou quem deveriam ser meus amigos. Ser mulher não me torna mais preocupada com as coisas da casa, ou pior motorista (nem melhor). Ser mulher não me faz ter o dom da maternidade, nem me torna uma pessoa mais ou menos temperamental. Eu não sou ignorante nem inocente: Sei que o preconceito existe e vejo acontecer o tempo todo. Qual o meu ponto? Eu não me vejo como uma vítima ou uma coitadinha. Nunca gostei de ser café com leite nas brincadeiras, e também me recuso a ser café com leite no mundo real. O que isso quer dizer? Eu não vou ficar aqui lamentando as agruras ou dificuldades de ser mulher num mundo essencialmente masculino, nem mesmo chorar pitangas sobre as desigualdades no tratamento dos gêneros. Aliás, quero deixar bem claro que ser mulher nunca me prejudicou – ou ajudou – profissionalmente. Eu fui criada para ser forte, independente e ser dona do meu destino, e é isso o que pretendo fazer, independentemente de qualquer possível condição externa. Vou fazer a minha parte para que as pessoas tenham condições mais iguais, sejam homens ou mulheres, e farei isso através da minha capacidade e da minha competência, através da qualidade do meu trabalho e dos resultados das minhas ações. Aonde eu quero chegar com essa conversa? Muitas vezes tendemos a culpar a vida, o universo e tudo mais pelos nossos fracassos, por não atingir os nossos objetivos. Bom, talvez o mundo tenha, sim, sua parcela de culpa. Seria muito bom viver em uma época mais evoluída, em que as pessoas fossem todas tratadas de forma mais humana e pudessem usufruir da sua liberdade de forma mais plena e racional, num contexto em que todos se respeitassem e se entendessem mutuamente. Só que as coisas não são assim, infelizmente. Talvez nunca sejam. Mas e aí? Você vai, simplesmente, se deixar abater pelo acaso, chorar e lamentar a sua condição? Ou vai levantar da sua cama de espinhos e fazer a sua parte como um agende da mudança? Quer que o mundo mude? Existe algo que você pode fazer, ainda hoje. Comece por você mesmo, sendo mais justo e respeitoso com os que são diferentes de você. Faça o que estiver ao seu alcance para possibilitar que todos tenham suas vozes ouvidas e mostrem a sua capacidade, através dos seus méritos e esforços. Que tal também parar de dizer que alguém pode algo “porque é homem”, ou deixa de poder “porque é mulher”? E que tal não bancar o café com leite para tirar vantagens que não merece? Essa é a minha reflexão de hoje: por um mundo com mais respeito ao próximo e com menos pessoas puxando os nossos cabelos – ou nossos tapetes. Mas, se eles forem puxados, que sejamos capazes de dar a volta por cima e mostrar por que estamos aqui.
Gabriela Besen Pedroso – www.gabrielapedroso.com.br