Artigo: Pescando com Árvores
A madeira sempre possui um papel importante na atividade pesqueira, sendo empregada para inúmeras finalidades, como na construção de embarcações e partes de petrechos utilizados na pesca ao longo de muitos anos. É muito provável que atualmente a madeira tem uma maior importância para a atividade quando está de pé e viva, na forma de uma suntuosa árvore. Muito melhor ainda quando estão juntas, formando áreas vegetacionais que fornecem uma série de benefícios aos seres humanos. Neste ponto da coluna, alguns leitores podem estar se perguntando: “A coluna não era sobre Aquicultura e Pesca? O que árvores e madeiras têm haver com isto?”. Portanto, contextualizar este ponto de vista é essencial para uma boa leitura. Sem dúvida nenhuma, a madeira continua e sempre será importante para se construir embarcações e partes de petrechos. Contudo, outros materiais podem substituir tão bem ou até mesmo melhor este recurso. Um exemplo é o emprego do aço para construir cascos de embarcações mais resistentes e seguras, possibilitando a navegação para pontos distantes da costa e com condições oceanográficas mais severas. Este fato colaborou consideravelmente ao acesso a estoques e para a abertura de novos mercados de pescados, auxiliando na consolidação da indústria pesqueira. Por outro lado, quando se observa algumas funções desempenhadas pela “madeira em pé”, na forma de áreas de vegetação, nota-se que algumas delas não são passiveis de serem copiadas ou substituídas, mesmo com toda a criatividade e engenhosidade humana. A existência destes locais está atrelada a uma melhor qualidade ambiental, por proverem benefícios sem custo aos seres humanos, como, por exemplo, a manutenção da qualidade de água e a regulação climática. Seguem dois exemplos rápidos e em distintas escalas espaciais para corroborar ao exposto acima:
I) Localmente, os mosaicos de vegetação são responsáveis por se manter a qualidade e a quantidade de água nos corpos hídricos em uma bacia hidrográfica. Muitas vezes estes mosaicos são protegidos por lei, passando a ser denominados como “Áreas de Preservação Permanente (APP)”. Em áreas com pouca vegetação, onde as áreas desmatadas e urbanas são predominantes, a infiltração de água para o lençol freático tende a diminuir e os casos de enchente aumentar. Ou seja, menos água para os rios e mais para áreas secas. Além disto, a qualidade tende a piorar, concentrando nutrientes que alteram toda a vida aquática de rios, lagoas e estuários. Certamente, as atividades aquicolas e pesqueiras em corpos hídricos inseridos em áreas impactadas irão sofrer uma imensa perda na qualidade e na quantidade da produção.
II) Regionalmente, a Floresta Amazônica tem papel central na dinâmica de chuvas que caiem em nosso pais. A massa de ar repleta de água gerada na maior floresta do mundo vai até a Cordilheira dos Andes e, ao bater em suas montanhas, volta para banhar a região centro-oeste e sudeste do Brasil. O desmatamento amazônico, que vem ocorrendo em taxas desoladoras na ultima década, aparenta estar alterando a dinâmica de chuva no país, sendo que as recentes secas que ocorreram no sudeste do país podem estar associadas a este fator. Aqui no sul a situação é diferente: aumento de eventos climáticos extremos e da quantidade de chuvas, decorrente da maior entrada de massas advindas do oceano Atlântico. Ou seja, mais água aqui do que o normal, o que influência a safra de recursos importantes para a região, como, por exemplo, o camarão-rosa, que tende a sumir do estuário e ir para o mar nestas condições. A diminuição das pescarias de camarão frente o aumento de chuvas já foi registrada na Lagoa dos Patos, merecendo ser analisada de forma mais detalhada em nosso Complexo Estuarino. Os exemplos mencionados são apenas dois de muitos sobre a influência de áreas vegetacionais na qualidade ambiental e, consequentemente, nas atividades que dependem do meio ambiente. Entretanto, nem toda a área deve ser mantida em suas condições naturais. Existe uma legislação clara e detalhada sobre o assunto, diferindo áreas passiveis de serem modificadas de outras que devem ser preservadas. As pessoas que dependem da aquicultura e da pesca devem ter este conhecimento, pois a conservação e gestão de recursos naturais são assuntos essências quando se discute a viabilidade econômica e a sustentabilidade destas atividades.
Por:
Prof. Dr. Eduardo Guilherme Gentil de Farias, Engenheiro de Pesca
Prof. Dr. Giovanni Lemos de Mello, Engenheiro de Aquicultura
Prof. Dr. Jorge Luiz Rodrigues Filho, Biólogo
Prof. Dr. Maurício Gustavo Coelho Emerenciano, Zootecnista
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