Gabriela Pedroso

Ser chato agora é legal?

Eu venho pensando muito sobre isso ultimamente, sobre como os padrões para o que é bom ou ruim podem mudar com o tempo, sobre como certos comportamentos de pessoas “esquisitas”, “chatas” ou “caretas”, em uma ou duas décadas passa a ser considerado admirável, ou “legal”. Tempos atrás, por exemplo, ser chamado de nerd ou CDF era praticamente uma forma de bullying. Antes, legal era ir bem na escola “sem estudar”. Hoje o esforço é valorizado e incentivado, e o nerd se tornou o novo pop. Isso por um lado é muito bom, porque observamos uma mudança positiva de valores, na minha opinião. Por outro lado, eu vejo uma nova geração de extremos se formando. O extremo da perfeição.
Num passado não tão distante assim, a moda adolescente era se rebelar sem, exatamente, ter um motivo real para isso. Os ídolos da música eram figuras incompreendidas e geniais, que buscavam inspiração e alívio desse mundo tão medíocre nas bebidas e nas drogas. Viver a realidade não valia a pena, porque eles simplesmente eram bons demais para ela. Kurt Cobain e Axl Rose são apenas dois dos muitos exemplos que eu poderia citar aqui. E nem me fale de Amy Winehouse e Miley Cyrus, que não passam de inconsistências temporais, a meu ver. Durante muito tempo legal era pertencer ao grupo dos que faziam coisas erradas, dos que quebravam as regras, dos que tinham resultados sem esforço (ou ao menos é a imagem do que essas pessoas queriam aparentar).
De uns tempos para cá, no entanto, eu tenho visto uma mudança nesse padrão. Talvez porque boa parte dessa geração “rebelde” tenha crescido e percebido que a vida não é uma música grunge, e que os resultados não brotam em árvores. Talvez porque os pais queiram que seus filhos admirem modelos melhores. Eu não sei a resposta para isso, mas sei que hoje começamos a viver em um mundo que admira o extremo oposto do modelo anterior, e isso gera uma enorme carga de frustração. Legal é cortar o glúten. Legal é correr uma maratona. Legal é acordar todos os dias às 5 da manhã e dormir só quando dá. Legal é “hardwork” o tempo todo. Legal é ser tão apaixonado pelo seu trabalho que você nem fica cansado ou estressado. Legal é ser perfeito e ter a vida perfeita e nunca, nunca desanimar. Legal. Mas calma…
Ninguém consegue ser perfeito o tempo inteiro. Nem essas pessoas aparentemente sensacionais que admiramos através da mídia e das redes sociais. Todos cometemos deslizes e precisamos entender que está tudo bem. Até eles, só que eles não mostram. Acho muito legal vivermos em um momento em que o bonito e popular é fazer o que é certo e saudável. Acho ótimo as pessoas entenderem que elas são responsáveis pelos seus resultados e que devem batalhar por isso, mas também é preciso entender que é ok não ser uma máquina. É ok ser humano. É ok acordar tarde no final de semana, comer uma pizza e chorar quando algo dá errado. Você pode se perdoar por não ser perfeito. Mas não vire grunge… porque isso sim é chato.

Gabriela Besen Pedroso – www.gabrielapedroso.com.br

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