Os camarões peneídeos têm parte do seu ciclo de vida associado aos estuários e manguezais e, por isto, toleram variações na salinidade do meio. Lógico, maior ou menor resistência a uma ampla variação, dependerá da espécie.
No caso do Litopenaeus vannamei, principal espécie produzida no Brasil e no mundo, o seu cultivo é possível tanto em água doce como em águas bem salgadas (40-50 ppt). A eurihalinidade é uma das características que fazem a espécie ser considerada bastante “rústica”.
No desenvolvimento da carcinicultura marinha pelo mundo, enfermidades virais e especulação imobiliária forçaram produtores a buscarem novas áreas de produção. Com o tempo, novas fazendas foram surgindo cada vez mais longe do mar/estuários, até que as primeiras em água oligohalina e doce demonstraram viabilidade técnico-econômica. Lembro-me da Fazenda Beckhauser, localizada em Imaruí. Construída não mais às margens da Lagoa de Imaruí, e sim no Rio Aratingaúba. Esta fazenda passou “em branco” em alguns episódios de Mancha Branca (anos de 2004 e 2005), muito em razão da água oligohalina/doce que utilizava e também por não estar em contato “direto” com o Complexo Lagunar Sul.
Por ser um animal osmorregulador, o camarão marinho necessita manter constantes suas concentrações plasmáticas de sais/íons, como o cloreto, sódio, sulfato, magnésio, cálcio e potássio. Em águas com baixas salinidades há uma tendência do animal em perder passivamente estes sais para a água, em especial via difusão branquial (há perdas também na urina e fezes). É preciso “tomar” estes sais novamente do meio.
O equilíbrio/relação entre estes diferentes sais, denominado de equilíbrio iônico ou balanço iônico é mais importante, inclusive do que a própria concentração total de sais. Vamos a um exemplo prático: é melhor o camarão estar numa salinidade de 1 ppt com um correto balanço entre aqueles seis principais íons (Cl, Na, SO4, Mg, Ca e K), do que numa salinidade de 30 ppt formulada apenas com cloreto de sódio/sal de cozinha (NaCl).
A boa notícia é que, de fato, nem o próprio meio, que seria a água de cultivo, precisa ter estes sais disponíveis nas quantidades/concentrações necessárias. Geralmente a correção do meio é mais cara. Estes sais podem ser adicionados na dieta (via rações!). Ou seja, por exemplo, aquele íon potássio (K+) que o animal necessita, você incorpora na ração e está resolvido.
Outra questão importante são os níveis de dureza e a alcalinidade da água. Níveis considerados adequados para o L. vannamei estão em 60 mg/L de CaCO3 para a dureza e entre 100 a 140 mg/L de CaCO3 para a alcalinidade. Outra boa notícia é que você corrige estes parâmetros, por exemplo, com a adição da calcário dolomítico na água de cultivo.
Se você estiver buscando uma nova área para cultivo de vannamei, procure águas subterrâneas (ou de outra fonte) que tenham níveis próximos aos ideais de dureza e alcalinidade. Algumas águas de poço/ponteira são bastante duras, e isto vai facilitar bastante a sobrevivência e o crescimento dos animais.
Na região do semiárido cearense, o município de Jaguaruana vem se destacando nos últimos anos como um grande produtor de camarão marinho… Peraí, camarão marinho? Sim, o mesmo antigamente cultivado em Laguna! Esta cidade já tem mais de 2 mil hectares de viveiros em produção, boa parte, abastecidos por ponteiras. Duvida? Viaje pelo Google Earth até lá e você verá imagens de satélites recentes com centenas de viveiros de camarão (iguais aos de Laguna) no meio do semiárido, no meio do nada. Lá, com certeza, o sertão virou mar!
Por:
Prof. Dr. Eduardo Guilherme Gentil de Farias, Engenheiro de Pesca
Prof. Dr. Giovanni Lemos de Mello, Engenheiro de Aquicultura
Prof. Dr. Jorge Luiz Rodrigues Filho, Biólogo
Prof. Dr. Maurício Gustavo Coelho Emerenciano, Zootecnista
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