Diante da exposição vivida atualmente, cabe refletirmos o quanto isso, de certa forma, nos torna mais expostos aos olhares alheios e mais do que isso, aos sentimentos alheios. Um dos sentimentos existentes na condição humana é o da inveja. Considerada um dos primeiros pecados da humanidade, há relatos do impacto dessa emoção em nossa vida relatada na Bíblia, em Gênesis, na passagem em que Caim matou seu irmão Abel por inveja. (Gn 4,8). Outros personagens bíblicos como José e Davi sentiram o “peso” da inveja, inclusive vinda dos mais próximos, seus irmãos. De lá para os dias atuais, infelizmente, não evoluímos muito no quesito felicidade pelo sucesso alheio. Na literatura infantil e dramaturgia brasileira temos também inúmeros exemplos vivenciados em livros, novelas e minisséries, gerando conexão com as pessoas pela similaridade do que vivem. E, no ambiente corporativo, onde muitos maquiam a inveja e nem sempre demonstram o desconforto com o sucesso alheio.
Imagine a seguinte cena, você acaba de ser promovido ou de comprar o apartamento dos seus sonhos, consegue engravidar depois de anos tentando, troca seu carro por aquela tão desejada “nave”. Você, neste momento, está prestes a explodir de tanta felicidade, euforia, fé. Consequência de todo seu esforço, privação, trabalho, competências usadas da forma correta, logo, resultados positivos. E aí, o que você faz? Posta! Compartilha, conta, liga para os “amigos” para compartilhar suas vitórias imaginando que todos irão sentir o mesmo que você. Só que alguém próximo a você solta algo do tipo: “Nossa que invejinha boa estou de você!” Minha pergunta é se existe inveja boa? Você sabe o que é a inveja? Você já a sentiu?
Para quem não sabe, inveja é olhar para algo que pertence a outra pessoa e nos sentirmos mal porque ela tem algo, acreditamos nós, melhor do que o que temos. Inveja ou invídia, é um sentimento de angústia, ou mesmo raiva, perante o que o outro tem e a própria pessoa não tem. Desgosto provocado pela felicidade ou prosperidade alheia. No livro A Cabala da Inveja, Nilton Bonder, relata que a inveja não só nos deixa desconfortável com as conquistas do outro, como também alimenta crenças sobre a temática de injustiça e vitimização. Já que ficamos buscando uma explicação sobre o sucesso do outro, geralmente, desmerecendo seu esforço ou reforçando que se fosse com você, o líder não seria “tão legal”, a situação não seria tão fácil, as condições seriam diferentes. Parece que o mundo sempre está devendo algo para o invejoso.
A inveja pode ser sentida como uma dor física, por isso nos incomoda tanto. Um estudo publicado pela revista Nature, identificou no cérebro humano a manifestação da inveja. Ao utilizar ressonância magnética, verificaram que a sensação provocada é interpretada por nós de maneira similar a uma dor física quando os participantes da pesquisa se comparavam com pessoas que tinham recebido algo, seja uma promoção ou a conquista de um bem material.
Se invejar, de certa forma, faz parte de nossa rotina, porque negamos que a sentimos? Primeiro por falta de consciência, quando alguém compartilha algo bom que aconteceu consigo e nos sentimentos mal, fingimos que não estamos sentindo, como uma armadura para fugir da nossa própria sombra, ou você nunca se sentiu assim? Encare seus sentimentos, principalmente aqueles não tão bonitos. Não é saudável sentir inveja assim como não é saudável mascarar que você não a sente. Quanto mais próximo da sua sombra mais rápido chegarás na luz.
É fato que sempre que nos comparamos com os outros nos colocamos em uma posição, na maioria das vezes, de inferioridade. E então, vem aquela sensação de que a grama do vizinho é mais verde e está iniciado o ciclo da inveja. Sempre que olharmos para o outro no sentido de nos compararmos, podemos disparar um ciclo negativo caso não tenhamos consciência de fazer a análise completa da “grama do outro”, como por exemplo: em quanto tempo, como, com que habilidades, com quais formações, com quais modelagens, com quais parceiros. Aí sim, conseguimos ter uma noção real sobre o outro e então, usá-lo como um referencial positivo e não para querer ter o que ele tem.
Você pode estar pensando: “Ah, então a partir de agora não vou me expor mais, nem compartilhar com os outros minhas conquistas…” E eu lhe pergunto: o que você está tentado controlar? De fato, não controlamos o que os outros pensam e sentem, por isso, não adianta querer controlar a forma como o outro lhe (in)veja mas, o que podes fazer para minimizar o impacto disso em sua vida é que independentemente do que digam, você siga firme no seu propósito, naquilo em que você acredita e que tanto se esforçou para ter/ser. Se preservar em algumas situações pode ser estratégico, compreenda, é você que está feliz e não o mundo. E na minha visão o mais importante, devolva ao outro o que você tem de melhor, afinal, cada um oferece o que tem, seja aquele que gostaria que fossem para você, no trabalho, família e entre amigos.
Por Letícia Zanini – Master Coach, Psicóloga e Educadora Comportamental