Em segundo lugar, como consequência, todos dependemos uns dos outros. A compreensão africana “Ubuntu” bem o expressa: “eu só sou eu através de você”. Portanto, todo individualismo, alma da cultura do capital, é falso e anti-humano. O coronavírus o comprova. A saúde de um depende da saúde do outro. Esta mútua dependência assumida conscientemente, se chama solidariedade. Foi a solidariedade que outrora, nos fez deixar o mundo dos antropoides e nos permitiu sermos humanos, convivendo e nos auto-ajudando. Assistimos nestas semanas gestos comoventes de verdadeira solidariedade, muitos ajudando a outros, fracos a fracos.
Em terceiro lugar, somos seres essencialmente de cuidado. Sem o cuidado, desde de a nossa concepção e durante toda a vida, ninguém subsistiria. Precisamos cuidar de tudo: de nós mesmos, caso contrário podemos adoecer e morrer, dos outros que me podem salvar ou eu os posso salvar, da natureza senão ela se volta contra nós com vírus deletérios, com estiagens desastrosas, com enchentes devastadoras, com eventos climáticos extremos, cuidado para com a Mãe Terra para que continue a nos dar tudo aquilo que precisamos para viver e que ainda nos queira sobre seu solo, já que, durante séculos, a agredimos de forma impiedosa. Especialmente agora sob o ataque do coronavírus todos devemos nos cuidar, cuidar dos outros mais vulneráveis, nos recolher em casa, manter o distanciamento social e cuidar da infra-estrutura sanitária sem a qual assistiremos a uma catástrofe humanitária de proporções bíblicas.
Em quinto lugar, descobrimos que devemos ser todos corresponsáveis, vale dizer, ser conscientes das consequências benéficas ou maléficas de nossos atos. A vida e a morte estão em nossas mãos, vidas humanas, vida social, econômica e cultural. Não basta a responsabilidade do Estado ou de alguns, mas deve ser de todos, pois todos são afetados e todos podem afetar. Todos devem aceitar o confinamento.
Por fim, descobrimos a força do mundo espiritual que constitui o nosso Profundo, lá onde se elaboram os grandes sonhos, se colocam as questões derradeiras sobre o sentido de nossa vida e onde sentimos que deve existir uma Energia amorosa e poderosa que tudo perpassa, sustenta o céu estrelado e nossa própria vida sobre qual não temos todo o controle. Podemos nos abrir a ela, acolhê-la e, como numa aposta, confiar que é Ela nos segura na palma de sua mão e que, apesar de todas as contradições, garante um fim bom para todo o universo, para nossa história sapiente e demente e para cada um de nós. Se cultivarmos esse mundo espiritual nos sentimos mais fortes, mais cuidadores, mais amorosos, enfim, mais humanos.
Sobre estes valores nos é concedido sonhar e construir outro tipo de mundo, biocentrado, no qual a economia, com outra racionalidade, sustenta uma sociedade globalmente integrada, fortalecida mais por alianças afetivas do que por pactos jurídicos. Será a sociedade do cuidado, da gentileza e da alegria de viver.
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