O princípio andrópico fraco e forte
Para conferir alguma compreensão a essa refinada combina-ção de fatores, criou-se a expressão “princípio andrópi-co” (que tem a ver com o homem). Por ele se procura res-ponder a esta pergunta que naturalmente colocamos: por que as coisas são como são? A resposta só pode ser: se fosse diferente nós não estaríamos aqui. Respondendo assim não cairíamos no famoso antropocentrismo que afirma: as coisas só têm sentido quando ordenadas ao ser humano, feito cen-tro de tudo, rei e rainha do universo?
Há esse risco. Por isso os cosmólogos distinguem o princípio andrópico forte e fraco. O forte diz: as condições iniciais e as constantes cosmológicas se organizaram de tal forma que, num dado momento da evolução, a vida e a inteligência deve-riam necessariamente surgir. Essa compreensão favoreceria a centralidade do ser humano. O princípio andrópico fraco é mais cauteloso e afirma: as prá-condições iniciais e cosmoló-gicas se articularam de tal forma que a vida e a inteligência poderiam surgir. Essa formulação deixa aberto o caminho da evolução que demais a mais é regida pelo princípio da inde-terminação de Heisenberg e pela autopoiesis dos biólogos chilenos Maturana–Varela.
Mas olhando para trás, nos bilhões de anos, constatamos que de fato assim ocorreu: há 3,8 bilhões de anos surgiu a vida e há uns quatro milhões de anos, a inteligência. Nisso não vai uma defesa do “desenho inteligente” ou da mão da Providên-cia divina. Apenas que o universo não é absurdo. Ele vem carregado de propósito. Há uma seta do tempo apontando para frente. Como afirmou o astrofísico e cosmólo-go Feeman Dyson: “parece que o universo, de alguma ma-neira, sabia que um dia nós iríamos chegar” e preparou tudo para que pudéssemos ser acolhidos e fazer o nosso caminho de ascensão no processo evolucionário.Curiosamente, quan-do no processo da evolução apareceram as flores (antes era tudo verde),nesse momento surgiu nosso ancentral. Parece que o universo e Deus lhe prapararam um berço de flores pa-ra enfatizar a alta qualidade deste ser que estava iniciando sua jornada pelos séculos até chegar a nós.
O universo autoconsciente e portador e espírito
O grande matemático e físico quântico Amit Goswami, que muito vem ao Brasil, sustenta a tese de que o universo é au-toconsciente (O universo autoconsciente, Record 2002). No ser humano ele conhece uma emergência singular pela qual o próprio universo através de nós se vê a si mesmo, con-templa sua majestática grandeza e chega a uma certa culmi-nância.
Cabe ainda considerar que o cosmos está em gênese, não está pronto, está ainda se autoconstruindo e em expansão contí-nua. Cada ser mostra uma propensão inata a irromper, cres-cer e irradiar. O ser humano também. Apareceu no cenário quando 99,96% de tudo já estava pronto. Ele é expressão do impulso cósmico para formas mais complexas e altas de existência.
Alguns aventam a ideia: mas não seria tudo puro acaso? O acaso não pode ser excluído, como mostrou Jacques Mo-nod no seu livro O acaso e a necessidade, o que lhe valeu o prêmio Nobel em biologia. Mas ele não explica tudo. Bio-químicos comprovaram que para os aminoácidos e as duas mil enzimas subjacentes à vida pudessem se aproximar, constituir uma cadeia ordenada e formar uma célula viva se-riam necessários trilhões e trilhões de anos. Portanto, mais tempo do que o universo e a Terra possuem de fato, que é de 13,7 bilhões de anos. O recurso ao acaso é dar honra à igno-rância. Melhor é dizer que não sabemos.