Leonardo Boff

Os crucificados de hoje e o crucificado de ontem (Final)

Ele se interroga:

“Será que não foi absurda a minha fidelidade? Sem sentido a luta sustentada por causa dos oprimidos e por Deus? Não teriam sido vãos os riscos que corri, as perseguições que suportei, o aviltante processo jurídico-religioso a que fui submetido com a sentença capital: a crucificação que estou sofrendo?”

Jesus encontrou-se nu, impotente, totalmente vazio diante de Deus- Pai que se cala e com isso revela todo o seu Mistério. Jesus não tem mais ninguém a quem se agarrar.

Pelos critérios humanos, ele fracassou completamente. A própria certeza interior se lhe esvai. Apesar de o sol ter tramontado de seu horizonte, Jesus continua a confiar em Deus. Por isso grita com voz forte: “Meu Deus, meu Deus!”. No auge do desespero, Jesus se entrega ao Mistério verdadeiramente sem nome. Ele lhe será a única esperança para além de qualquer desesperança humana. Não possui mais nenhum apoio em si mesmo, somente em Deus que se escondeu. A absoluta esperança de Jesus só é compreensível no pressuposto de seu absoluto desespero. Mas onde abundou a desesperança, superabundou a esperança.

A grandeza de Jesus consistiu em suportar e vencer esta assustadora tentação. Esta tentação lhe propiciou uma entrega total a Deus, uma solidariedade irrestrita a seus irmãos e irmãs também desesperados e crucificados ao largo da história, um total desnudamento de si mesmo, uma absoluta descentração de si em função dos outros. Só assim a morte é verdadeiramente real e completa: a entrega sem resto a Deus e aos seus filhos e filhas sofredores, seus irmãos e irmãs menores.

As últimas palavras de Jesus mostram esta sua entrega, não resignada e fatal, mas livre: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23,46). “Tudo está consumado” (Jo 19,30)!

A sexta-feira santa continua, mas não é o último capítulo da história. A ressurreição, como irrupção do ser novo é a grande resposta do Pai e a promessa para nós. Ele é o primeiro entre muitos irmãos e irmãs que somos todos nós.

 

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