Leonardo Boff

A dimensão política da fé hoje (3ª parte)

Para as Escrituras judaico-cristãs a roda da política (ética) emerge mais importante que a roda da religião institucional (culto, cf. Mt 7,21-22; 9,13; 12,7; 21,28-31; Gl 5,6; Tg 2,14 e os profetas do AT). Sem a ética, a fé é vazia e inoperante. São as práticas e não as prédicas que contam para Deus. Não adianta dizer “Senhor, Senhor” e com isso organizar toda uma celebração e uma aeróbica religiosa; mais importante é fazer a vontade do Pai que é amor, misericórdia, justiça e perdão, coisas todas práticas, portanto, eticas (cf. Mt 7,21).
Por ética em política se entende a dimensão de responsabilidade, a vontade de construir relações de participação e não de exclusão em todos os âmbitos da vida social. É ser transparente e abominar a corrupção. Hoje os problemas, como a fome, o desemprego, a deterioração geral das condições de vida e a exclusão de grandes maiorias, são de natureza social e política, portanto, ética. Então a fé deve mostrar sua força de mobilização e de transformação (Fratelli tutti n.166).
Política social (P) e política partidária (p)
Como acenamos acima, há dois tipos de política: uma escrita com P maiúsculo e outra com p minúscula: a Política social (P) e a política partidária (p).
Política social (P): é tudo o que diz respeito ao bem comum da sociedade; ou então é a participação das pessoas na vida social. Assim por exemplo a organização da saúde, da rede escolar, dos transportes, a abertura e a manutenção de ruas, de água e esgoto etc tem a ver com política social, bem como lutar para conseguir um posto de saúde no bairro, se unir para trazer a linha de ônibus até no alto do morro: tudo isso é Política social. Definindo de forma breve podemos dizer: política social ou Política com P maiúsculo significa a busca comum do bem comum.
Política partidária (p): significa a luta pelo poder de estado, para conquistar o governo municipal, estadual e federal. Os partidos políticos existem em função de se chegar ao poder de estado, seja para mudá-lo (processo libertário), seja para exercê-lo assim como se encontra constituído (governar o status quo existente). O partido,como a palavra já o diz, é parte e parcela da sociedade não toda sociedade. Cada partido tem por trás interesses de grupos ou de classes que elaboram um projeto, visando toda a sociedade. Se chegarem ao poder de estado (governo) vão comandar as políticas públicas conforme o seu programa e sua visão particular dos problemas.
Com referência à política partidária, é importante a pessoa de fé considerar os seguintes pontos:
• Qual é o programa do partido?
• Como o povo entra neste programa? se foi discutido nas bases; se atende aos reclamos reais e urgentes do povo; se prevê a participação popular, mediante seus movimentos e organismos; se estes foram ouvidos na sua concepção, implementação e controle.
• Quem são os candidatos que representam o programa? Que biografia têm, se sempre mantiveram uma ligação orgânica com as bases, se são verdadeiramente aliados e representantes das causas da justiça e da transformação social com mais justiça e direitos ou se querem manter as relações sociais assim como são, com as contradições e até iniquidades que encerram.
Nos dias atuais, face à ascensão do pensamento conservador e facistóide no Brasil e outros países do mundo, faz-se necessária a participação de cristãos conscientes e engajados para recuperar a democracia que está sob risco de demolição, os direitos pessoais e sociais e também os direitos da natureza, devastada pela cobiça do capital brasileiro e mundial, responsáveis, entre outros, pelas grandes queimadas da Amazônia e do Pantanal.

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